Tempos de Pandemia: Psicoterapia e Violência Doméstica

A busca de atendimento psicoterapêutico pela mulher que sofre de violência doméstica na minha prática clínica, em consultório são vinculados a problemas de conflitos conjugais.
Relações formais de casamentos, companheiros de uma relação afetiva estável, noivados e namoros, os quais estão apresentando problemas. Buscam a psicoterapia como apoio pelas questões financeiras de dependência, de controles em relação a sociabilização, ciúmes, desejo de estudar e não ser entendida, de trabalhar e não ser apoiada, uso de drogas ou álcool, com apoio do parceiro que usa junto e ou mais. Brigas com os filhos ou o companheiro com os filhos.Não refere agressão física que sofre, em um primeiro momento.
Com o estabelecimento de empatia pelo problema abordado e vínculo acolhedor faço a pergunta: tem agressão física? Com vergonha e ao mesmo tempo alívio, responde que sim. Assim como em outros casos conta que passou por abuso sexual. Muitas vezes referem: é a primeira vez que conto!
Também pode revelar que seu esposo agride filhos, que foi agredida ou abusada por um irmão, pelo pai ou por um vizinho…
Como psicoterapeuta, quando uma paciente relata violência doméstica, meu papel é conhecer sua história de vida, ouvir, dar apoio, para que ela possa construir dentro da sua psique a permissão para sair desta relação, desse padrão de relação. Será um processo psicoterapêutico que demandará certo tempo, são pacientes que muitas vezes demoraram muito para buscar ajuda e temos que ter cautela.
Quanto melhor a auto-estima da mulher, mais fácil ela detecta que está sofrendo violência doméstica e emprega recursos emocionais e criatividade para sair da relação ou seja tem mecanismos de proteção interno desenvolvidos. A busca da psicoterapia ajuda na tomada de decisão, o aconselhamento jurídico é necessário muitas vezes reforçando ainda mais a decisão para sair da relação com menos danos possíveis: proteção judicial em alguns casos, perda econômico, guarda dos filhos…
Com o apoio e entendimento da psicóloga, a mulher recupera e ou desenvolve a força interna e toma a iniciativa de sair da relação antes de consequências mais danosas ocorrerem.
As pessoas que sofrem violência doméstica tem um desamparo interno enorme. Precisamos de todas as forças para apoiar estas mulheres. Hoje a mídia também ajuda muito. Notícias sobre Delegacia da Mulher, Lei Maria da Penha apoiam, pois a agredida psiquicamente ou fisicamente se identifica e permite que sua conduta de proteção fique reforçada.
Estudamos algumas hipóteses que corroboram para entendermos o que faz uma mulher tolerar uma relação violenta. Personalidade depressiva ou personalidade dependente. Cultura familiar onde o mau trato e o abuso fazem parte de sua família de origem, onde pais, tios, irmãos, avós abusavam de alguma geração e não ocorria nenhuma repressão. Vivências que marcam o desenvolvimento emocional de qualquer pessoa. Mulheres que passaram por maus tratos na infância em relação aos cuidados básicos e ou foram agredidas sem entenderem por que e ou de forma perversa com pais violentos ou irmãos que lhes batiam sem nenhum adulto interferir. Famílias onde o abuso sexual e ou a agressão era uma prática. Situação de carência econômica onde para estudar a mulher precisa morar na casa de alguém que a maltrata verbalmente. Namoros que iniciaram com agressão e arrependimentos e assim continuaram no casamento, com a esperança de melhorar, o que nunca acontece. Mulheres que para acompanhar o esposo em sua evolução profissional não trabalhou e no decorrer do casamento as brigas começam e a agressão física é incorporada a vida do casal, sentem-se dependentes economicamente e ameaçadas de não terem direito a nada com a separação. Nestes casos muitas vezes os filhos querem a separação, pois conviver com pais violentos ninguém deseja.
Muitos casais passam por crises e a pior maneira de enfrentar a crise é vivenciar a violência: sexual, verbal e física. Quando ocorre o primeiro episódio de agressividade física e o parceiro não se arrepende é o pior cenário, pois a possibilidade de ser uma prática permanece.
Alguns problemas psíquicos também podem tornar uma pessoa violenta, pessoas com diagnósticos psiquiátricos podem ter um episódios de agressão e quando medicados não o fazem mais, por isso importante o tratamento ser seguido para não ocorrer mais. Caso a pessoa ( homem ou mulher parceiro) não siga corretamente o parceiro deve se separar, pois irá acontecer novamente.
Uso de álcool e drogas dentro das famílias também predispõem a falta de controle dos impulsos, o indivíduo perde o discernimento e muitas vezes ao ser contrariado agride. Neste momento do Covid-19 onde o confinamento é necessário para algumas pessoas e o isolamento social indicado, casos de violência têm se intensificado. A mídia não refere números, apenas alerta para a necessidade de tratamentos locais, sugerem atendimentos online, os quais estão sendo permitidos e temos realizado de forma bem eficaz. A busca de uma delegacia mais próxima também está sendo indicada se necessário .
Para nós psicólogos não há justificativa e sim tratamento de quem está agredindo, abusando ou maltratando. Muitos não tem o desejo de melhorar, adoecendo junto seus familiares. Por isso muitos familiares vem buscar a Psicoterapia e com certeza serão ajudados se investirem na Psicoterapia.
Relações de trabalho também podem ocorrer, maus tratos: chefias agressivas verbalmente, que denigrem e não explicam, não chamam para feedback construtivo para a pessoa evoluir e agridem com críticas destrutivas. São situações de maus tratos emocionais, abuso psicológico, onde a mulher permanece sofrendo. Refiro mulher por ser o tema da LIVE que estarei participando e pela qual escrevi esse texto.
Como psicoterapeuta de orientação psicanalítica trabalho a Violência Doméstica através do entendimento da Compulsão a Repetição. Nesse caso da compulsão a repetição do mau trato. O que Freud nos ensinou a perceber : repetir um comportamento, recordar de onde ele vem no caso da violência doméstica e elaborar saindo do ciclo da violência com o apoio do processo psicoterapêutico , passando para outra forma de se relacionar sem ser maltratada, abusada, agredida.