Psicóloga Maria Alice Salles | Como Educar Nossos Filhos em Pleno Século XXI
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Como Educar Nossos Filhos em Pleno Século XXI

A reflexão que irei propor parte da minha experiência profissional, atendendo há cerca de 20 anos crianças, adolescentes, adultos e idosos.

Vou abordar esse assunto, tomando com referência a importância das figuras de pai e mãe. Entendo que muitas vezes quem exerce esse papel, sendo o cuidador mais próximo são os avós, os tios, parentes e inclusive professores. Também existe filhos que mesmo morando com os pais, foi adotado emocionalmente por outra família, que faz esse papel importante “de pai e de mãe” na vida da criança ou do adolescente.

O que irei trazer para vocês são constatações e ideias que, ao longo desses anos, pude perceber ouvindo, estudando e vivenciando o desenvolvimento infantil e adolescente. A minha fala não será desenvolvida a partir de uma teoria fechada, e sim terá como ponto de referência situações do cotidiano a partir das quais estudamos a melhor forma de conduzir os processos evolutivos de nossos pacientes.

Muitas vezes as famílias aprendem a lidar com seus filhos por tentativa e erro. O que sabemos é que certas condutas dos adultos podem favorecer o desenvolvimento de seu filho, outras nem tanto e algumas até prejudicam. E é por isso que estamos aqui: para entender um pouquinho a situação psíquica de nossos filhos do século XXI e do que podemos nos dar conta para ajudá-los.

QUEM CUIDA DE NOSSOS FILHOS

Temos escutado muito a expressão: as famílias têm terceirizado a criação dos seus filhos.

Dentro do entendimento da psicologia, “terceirizar” seria a falta de disponibilidade dos pais para cuidar de seus filhos, o que acarretaria o não acompanhamento do seu desenvolvimento, ou seja, não os ajudar a crescer dentro do pouco espaço de tempo que muitas famílias têm.

A família é o primeiro agente socializante, com sua hierarquia e atribuições de papéis: pai, mãe e filho. Crianças e adolescentes são espectadores das ações de seus pais e percebem as dificuldades e as ausências. Quando não assumem seus papéis e fingem que nada acontece, a tendência é que eles reproduzam essa postura. Quando reconhece suas dificuldades e demonstra culpa, o filho tem a possibilidade de entender e inclusive coloborar com as figuras de pai e mãe.

É na expressão corporal que a criança mostra que não está bem: momentos de intensa agressividade, intenso choro, dificuldade diária para dormir, problemas com a alimentação que chegam à desnutrição e/ou à obesidade, dificuldades de pertencer a um grupo na Escola, dificuldade de aprendizagem e etc. Tais características, e outras ainda, também podem aparecer na adolescência.

É muito importante que a família desenvolva a liberdade vigiada, quer dizer liberdade condizente com a faixa étaria do filho, principalmente na adolescência. Saber quem são os amigos dos filhos dos filhos, a família que esta inserida, acompanhamento da organização escolar desde os matérias escolares, horários até o rendimento escolar. Em relação ao adolescente observar os locais que frequentam, saber o rendimento escolar e se nevessário apoiar, ou seja os pais precisam mostrarsse próximos.

Os pais precisam de tempo para ser a referência dos filhos. E os filhos precisam aprender a respeitar os pais e a pactuar a presença ativa deles na sua vida, como modelo para a sua educação. Mesmo tendo uma rede de apoio “terceirizada”, com empregados, avós, escola, vizinhos e parentes, as figuras do pai e da mãe são muito importantes e insubstituíveis no psiquismo do ser humano. Façamos uma reflexão!

Na clínica, quando converso com o paciente sobre quem lhe cuidava, o ressentimento de não ter sido cuidado pelos pais aparece em muitos casos – muitas vezes um sentimento trazido quase como um trauma, por alguns  e de certa forma justificado, mas raramente expresso de forma tranquila.

Cuidar dos filhos é ceder tempo. A criança precisa da participação dos pais em algumas brincadeiras, para levar a parques, participar de jogos, trazer amigos em casa e monitorá-los, levar a festas. Quando maiores, para controlar e/ou ajudar nas tarefas escolares, levar e trazer das festas, para com isso conhecer seu grupo de amigos e promover a separação quando perceber que “não estão em boa companhia”. São atividades que devemos não terceirizar, para, assim, conhecermos os nossos filhos e nos aproximarmos do seu universo.

A rotina familiar ajuda muito na concentração da criança e do adolescente. Estamos em uma era em que a superestimulação está bem presente: podemos conversar 24 horas por meio das tecnologias que temos. A televisão, com seus mais diversos canais, fica ligada ininterruptamente. A sexualidade é conversada e falada abertamente dentro dos meios de comunicação . Nossos filhos têm muito acesso à cultura – e tudo é muito rápido.

 

QUEM ENSINA E QUEM EDUCA

Educar, segundo o dicionário Aurélio, vem de Educação: processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral da criança e do ser humano em geral, visando à sua melhor integração individual e social. Ensinar, transmitir conhecimento de; instruir, lecionar.

Entendemos que o filho precisa ser educado pela família para alcançar o ensino da melhor forma possível.

O principal papel da família é educar e desenvolver ensinamentos. É com a família que aprendemos a amar, a beijar, a abraçar a nos relacionar. E é ela que se responsabiliza pelo cuidar do corpo do filho, dos primeiros passos, da alimentação, pelos cuidados com a rotina, ou seja responsável pela saúde física e mental. Para ensinarmos, temos de estar presentes, pois este é um trabalho personalizado.

Crianças ou adolescentes que se machucam muito, que se colocam em situações de risco muitas vezes desejam ser mais olhados. Os que apresentam problemas de aprendizagem muitas vezes não foram ensinados a estudar, a cuidar de seu caderno, de seu material, a ter uma rotina para estudar, a ter uma parceria nesse momento chatinho para alguns. Muitos Défcit de Atenção se desenvolvem pelo Défcit da Atenção.

Uma criança que foi educada pela família esta mais favorecida  desenvolver a tolerância para ser ensinada. Por tolerância não estou fazendo referência a um filho robotizado, mas, sim, que consiga entender, mesmo com um pequeno sofrimento, que aquela é a hora de aprender as mais diversas aprendizagens. Frustação faz parte da vida.

Quando o filho vai para a creche e/ou escola, os pais devem estar seguros de que seu filho será bem cuidado. E tal cuidado tem de ser monitorado pelos pais. A escola tem um significado enorme dentro da família, a começar pela sua escolha. Os filhos têm de estar seguros de que seus pais gostam, entendem e concordam com a filosofia da escola para que tenham motivação e respeito para com esse espaço e seus professores. Não existe escola perfeita, precisam ter tal noção.

Não podemos esquecer que o filho é dos pais, e não da escola. A família é a mais significativa referência na vida da criança e do adolescente no processo de aprendizagem como um todo. É o período que é muito lembrado por pacientes adultos e idosos inclusive.

A família é o primeiro agente socializante; a partir dela, o mundo e suas hierarquias são compreendidos. A definição dos papéis se inicia no seio das famílias: os tipos de organização familiar, as frustrações familiares, os exemplos familiares, as doenças familiares.

Famílias conflitadas muitas vezes podem gerar crianças e adolescentes com muitas dificuldades, mas não é determinante. Muitos são sobreviventes que usam a capacidade de resiliência para superar as suas faltas e conseguem ter um bom desenvolvimento. Na minha prática como psicoterapeuta de orientação psicanalítica observo na  clínica que sequelas muito íntimas ficam, mesmo as não exteriorizadas na conduta. Memórias permanecem.

Em minha amostra do trabalho clínico de crianças e adolescentes, ainda percebo que a participação do pais precisa ser estimulada. Alguns pais ou familiares imaginam que levando o filho a psicoterapia já estão fazendo o seu papel, sim estão iniciando o processo e precisamos da famílias em algumas consultas para seguir auxiliando na evolução. A técnica exige que antes de conhecermos as crianças e ou adolescente conhecemos os pais ou responsáveis inclusive.

 

EXEMPLOS DE CASOS

Paciente de 6 anos, filho único, morava com os pais e tinha uma babá. A mãe possuía uma carga de trabalho maior que a do pai e mostrava-se muito estressada, com sintomas de ansiedade. Moravam em uma casa confortável. O menino apresentava problemas de comportamento na escola, com conduta agressiva. Eu jogava futebol no consultório com ele como forma de observar como era o seu comportamento durante o jogo e para facilitar o vínculo nas primeiras consultas. Um dia perguntei: “Gabriel, quem joga futebol contigo na tua casa?”. Ao que ele respondeu: “Meus vizinhos ou minha mãe”. A mãe tinha uma queixa: o pai era pouco participativo na educação do filho. Quando chamei os pais para a devolução da avaliação inicial, reforcei a necessidade de o pai estar mais presente na vida de Gabriel e a mãe não centralizar tanto as funções dos cuidados, já que ela passava muita ansiedade para o filho. O pai ouviu de forma empática e referiu: “ Ela se mete e vai na frente em tudo”. Fizemos algumas combinações: alguns dias, o pai irá buscá-lo na escola, irá procurar jogar futebol e fará programas com o filho sem a presença da mãe. Condutas cujo objetivo era fortalecer o vínculo pai e filho, para, assim, o pai sentir-se seduzido pelo filho e querer participar cada vez mais da criação do menino – uma vez que nossos filhos desenvolvem a afetividade pela presença ativa.

Adolescente de 14 anos com dificuldades escolares, segundo os pais, não queria estudar. Com 2 anos foi morar em um país de língua inglesa até a sétima série. Naquele momento estava na oitava série. Os pais encaminhavam o processo de separação, e Tiago iria ficar com a mãe. Orientei os pais a procurarem uma pedagoga para ajudar a organizar os estudos, e assim o fizeram. Conversando com Tiago, ele me diz: “Eu nunca estudei na minha vida, nem tema eu fazia, agora não sei. Meu pai sabe um monte de matemática e com ele eu iria aprender, só que ele não tem tempo nunca”. Chamo o pai e reforço o quanto o filho precisava dele e de seus ensinamentos, era necessário apenas que o pai se mostrasse disponível, o pai concorda em colaborar prontamente. Passado um ano, Tiago bem adaptado ao retorno, inicia a ir a festas. Como no seu ambiente familiar, tanto por parte de mãe quanto por parte de pai, existia um abuso de álcool, Tiago começou a apreciar as bebidas, e nas consultas contava: “Maria Alice, tomei outro porre!”. Ele voltava de taxi das festas. Um dia, perguntei-lhe: “Tiago, se o teu pai fosse te buscar, tu tomarias esses porres?”. “Claro que não, imagina meu pai ir me buscar e me ver assim!?”, me responde ele. Novamente chamo o pai e oriento a ir busca-lo, o pai novamente coloca-se disponível. A família não conseguia se comunicar, foi uma separação muito conturbada.

Mariana, 19 anos, apresenta problemas com a alimentação. Não quer aumentar de peso, ainda que esteja com peso baixo. Vomita para não ter a possibilidade de ser gorda. Tem úlcera e dentes porosos. Começou a vomitar aos 16 anos e só agora busca ajuda. Conta que seus pais trabalhavam muito e nunca ficavam de dia com ela. Mariana era cuidada por uma vizinha nos seus primeiros anos. Negava-se a comer e a vizinha não tinha o que fazer, “só tomava toddynho”. Depois, na pré-escola, “só comia porcaria”. Investigando melhor, ela comenta: “Eu só comia na mesa quando minha mãe estava em casa à noite. Aí ela me obrigava a comer arroz e feijão e me fazia sentar à mesa. Se hoje tenho um pouco de saúde é porque ela fazia isso”.

 

SUGESTÃO AOS PAIS QUE TÊM POUCO TEMPO

Procurar, sempre que possível, dar banho em seu filho, quando bebê. Este é um dos momentos de maior intimidade entre pais e filhos.

Procurar, sempre que possível, arrumar a mesa e comer com o filho. Caso os pais não possam estar em casa e a criança fique com algum cuidador, que este sente à mesa, de preferência sem tablete e ou televisão ligados, promovendo uma boa conversa ou contando a história de um livro quando pequenos. Isso proporciona uma maneira mais próxima de se fazerem as refeições. A mesa para almoço e a janta deve ser preservada. Muitos casos de Transtornos Alimentares provêm de uma hora da refeição pouco cuidada em termos de qualidade do momento e qualidade do alimento. Durante a semana, pode ser difícil para os pais estarem à mesa, então no final de semana deve fazê-lo. A família deve cuidar do momento das refeições.

Quando o filho é maior, pode ir até o trabalho do pai para almoçar ou ir almoçar fora com este, caso não consigam fazer essa atividade em casa.

Procurar, na ausência dos pais, que o filho adolescente almoce com algum familiar. A referência da família é muito importante.

Quando o filho tiver um problema escolar, procurar a escola, observar muito o comportamento, a motivação para a ida ao colégio. Qualquer dúvida, procurar a professora, buscar apoio pedagógico, orientação psicológica. Crianças e adolescentes ainda estão em um processo evolutivo que podemos acompanhar, tratar e melhorar para que tenham uma vida com o mínimo de problemas, em sua faculdade e profissão. Conflitos fazem parte do processo evolutivo, mas, dependendo da intensidade, as sequelas podem trazer muito prejuízo.

 

CONFIGURAÇÕES FAMILIARES DO SÉCULO XXI

O conceito de família mudou. O homem não se sente mais o único responsável por prover, a mulher conquistou espaços fora dos contornos domésticos. Os casais separam-se, casam-se novamente e muitas vezes formam famílias que extravasam o par conjugal.

Muitas mulheres são as provedoras dos lares e com frequência não querem a ajuda dos homens na criação dos filhos. Há homens que cuidam da vida doméstica e muitas vezes assumem a casa e os filhos, sem desejar a ajuda da mulher. Outros tantos desejam um par e não o têm, assumindo o papel de “pai ou mãe solteiros” não por opção.

Precisamos lembrar que, para um desenvolvimento mais saudável, é importante a participação do pai e da mãe, desde que estes não promovam abuso psicológico ou físico.

Os filhos assumem a sua sexualidade heterossexual, homossexual e bissexual cada vez mais cedo, porque a sociedade está menos repressiva e preconceituosa. Levam amigos e namorados para dentro de casa e assumem o espaço com o consentimento dos pais, que saem para deixá-los mais à vontade muitas vezes, conduta que deve ser bem avaliada.

O uso de álcool na adolescência se inicia, muitas vezes, dentro de casa, com os pais comprando e deixando os amigos dos filhos consumi-lo antes dos 18 anos. Esse fato não é permitido por lei e, emocionalmente, é o maior gerador de baixo rendimento escolar, de distúrbios de conduta e emocionais, como a ansiedade e a depressão. Tal permissão deve ser muito bem avaliada, pois são drogas licitas e psicoativas.

A permissão de relações sexuais precoces estáveis também aparece com a seguinte justificativa: “Prefiro que namore em casa do que na rua, porque está tudo muito perigoso”. Assim, os namorados muitas vezes dormem juntos como se isso fosse parte do namoro. A permissão deveria vir com a maturidade, mas em muitos casos vem bem antes. Tal atitude pode gerar conflitos nos adolescentes, que, mesmo tendo vontade de liberdade, já têm um casamento validado pela família.

 

GERAÇÃO Y OU GERAÇÃO DA INTERNET

Geração Y é um conceito da sociologia que, segundo autores, se refere às crianças nascidas entre1980 e os dias de hoje.

São as crianças nascidos num ambiente de grandes avanços tecnológicos, muitos materiais para serem consumidos e pais fora de casa por muito tempo. Alguns pais começam a compensar seus filhos com brinquedos e objetos do desejo desses, reforçando o estabelecimento de um vínculo com o consumo. Para muitos pais, a ideia de “dar tudo ao filho compensaria a sua ausência”.

O interesse e a facilidade das crianças com jogos eletrônicos podem gerar dois problemas: agitação e isolacionismo.

A criança e o adolescente agitados precisam de atividades esportivas que lhes cansem e outras que lhes acalmem. As atividades calmantes são mais efetivas com o estímulo do adulto (ler livros, ver filmes, ir a cinemas, brincar junto, preparar comida e comer junto…).

Crianças e adolescentes caseiros precisam de atividades livres, esportivas, fora de casa, para evitar o sedentarismo e promover a sociabilização, muitas vezes estimulada por um adulto, o qual fará companhia também como forma de motivar. Os caseiros muitas vezes gostam de estar na companhia de jogos eletrônicos das mais diversas maneiras, promovendo o seu isolamento e a sua exclusão social.

Os pais devem estar atentos para os seguintes aspectos: se os jogos são compatíveis com a faixa etária e se o tempo de uso não está levando a um prejuízo cognitivo, social, fisico e de conduta.

Jogos eletrônicos servem para as pessoas de certa forma descarregarem suas energias ou carregarem-se de irritabilidade, agitação e insônia. Promovem, muitas vezes, o individualismo e a competição em demasia, assim como desenvolvem áreas da inteligência inclusive. Devemos cuidar!

 

A GERAÇÃO Z

Aqueles indivíduos nascidos entre os anos 1990 e a primeira década dos 2000 fazem parte da geração Y e estão essencialmente preocupados com o meio ambiente.

Na clínica, observo adolescentes vegetarianos em razão da morte de animais. (Isso com idade em torno dos 13 anos.)

 

CONCLUSÃO

Como deixei claro, os pais são a grande referência dos filhos. Isso significa que, por isso, devem cuidar o quanto estão conectados com seus filhos.



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